Obsessão Infinita

Adriana Ricci

Obsessão InfinitaDa repetição à invenção

É possível conferir em São Paulo, até o dia 27 de julho, a exposição da qual tomo emprestado o título para este texto. Obsessão infinita é a primeira retrospectiva da obra de Yaoi Kusama na América Latina.

A obsessão em questão é expressão artística de Kusama, 85 anos, japonesa residente de um hospital psiquiátrico desde a década de 70. A informação de seu endereço atual não deve ser privilegiada, assim como não o é na biografia da artista, disponível em seu site oficial[1]:  Ofereço ao leitor apenas como curiosidade para o encontro com seu percurso ousado, obsessivo e circular.

A suposta (in)finitude ganha contornos de realidade ao materializar-se em obras que podem ser acompanhadas - caso você seja impelido a organizar esta experiência - numa linha do tempo a partir dos anos 50 e distribuídas em 4 salas do Instituto Tomie Ohtake[2].

Abundantemente em suas obras estão as bolinhas, ou polka dots, padrões gráficos que nos remetem a roupas infantis, biquínis-de-bolinha-amarelinha e porque não mencionar, instrumentos paliativo-corriqueiros de alívio da ansiedade, como o plástico-bolha. Objetos fálicos também marcam presença em sua obra. Ela declara: “Artistas não costumam expressar seus próprios complexos psicológicos diretamente, mas eu adoto meus complexos e medos como temas.”

Os pontilhados e as séries de pinturas Redes Infinitas são tão atuais nos dias de hoje, que a artista antecipou na metade do século XX. Essas expressões interessam à psicanálise porque falam do novo laço social, da fragilidade dos vínculos, das relações que sofrem rupturas de modo muito mais rápido, como Jorge Forbes vem trabalhando.

Yayoi se exibe e compartilha representações do sem-nome insistente em suas alucinações visuais, exteriorização da mais singular estranheza que a artista divide com quem se propõe a visitá-la.

Sem manifestar qualquer defesa à visão romântica da arte como expressão de loucura ou de me aprofundar na ciência explicativa de tais movimentos ou fenômenos, atenho-me ao teor de inspiração que se recorta da experiência artística e do, ouso dizer, bem-sucedido, processo de invenção de respostas para o inexplicável e de responsabilização por tais respostas e expressões singulares, proposta do trabalho analítico.

Yaoi, nesta exposição, nos dá oportunidade de um encontro com o real.

Adriana Ricci é psicóloga pela Universidade de São Paulo e Especialista em Desenvolvimento Organizacional.

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Data de publicação: 23/07/2014