O choro da ventania

Dorothee Rüdiger

O choro das criançasNão há palavras diante do real

“As crianças choram sem parar.” As palavras emocionadas do repórter Luciano Tsuda, enviado da rede Globo à cidade de Tacloban, nas Filipinas, ecoam no ar, enquanto os brasileiros se preparam para dormir. Sobreviventes do tufão Haiyan, que atingiu o país no sábado passado, são as crianças quem melhor expressam o que nos move enquanto seres humanos, quando estamos diante das surpresas que a natureza, berço da vida, mas também seu túmulo, nos prepara. Incapazes de falar por serem infantis, mostram com suas lágrimas que, diante do Real, segundo aprendemos com Jacques Lacan, não há palavras.

Enquanto os adultos, impotentes diante das forças da natureza, provocadas ou não pelas agressões da civilização global irresponsável para com seu ambiente, buscam palavras e ações, as crianças nos tocam lembrando que palavras e ações são curativos, para lembrarmos, mais uma vez, Jacques Lacan.

Não adianta chorar, sabem os adultos. É preciso tomar atitudes, ser responsável por daquilo que nos ocorre, independente do nosso querer, parafraseando aqui Jorge Forbes. Prestar solidariedade aos sobreviventes, emprestar a pá e os braços para enterrar os mortos é tão necessário quanto emprestar dinheiro para reerguer essa civilização que, feita castelo de areia, foi levada pelo tufão.

No entanto, por mais poderosa que seja a civilização que se reerguer, com suas regras e seus prédios, por mais que se esqueçam das notícias de mais uma tragédia, permanecerão o choro das crianças e a sensibilidade de um repórter capaz de escutá-lo.

Dorothee Rüdiger é psicanalista e doutora em Direito pela Universidade de São Paulo

Data de publicação: 14/11/2013