Lições das politicamente incorretas “mães do Ocupa Sampa”

Elzira Uyeno

Mães do Ocupa SampaO que nos ensinam as mães desses movimentos de protestos?  A assumir um amor sem intermediações, sem garantias

A expressão “mães do Ocupa” encerra certamente uma ambiguidade: pode significar idealizadoras e também mães participantes do “Ocupa Sampa”, movimento de protestos que se inscreveu na “epidemia das marchas” descrita por Jorge Forbes e levou jovens a acamparem no centro de São Paulo em 2011, inspirados no jovens indignados com a crise economia norte-americana, que literalmente “acamparam” em Wall Street.

Nomeia, contudo, as ativistas que se engravidaram de ativistas que conheceram na ocupação. Nove meses após o fim do acampamento, o “Ocupa” vive um "baby boom". Para a incompreensão sob uma avaliação lógica, os ativistas se dizem “indignados”, num Brasil que vive a condição privilegiada de ter passado incólume à crise econômica mundial, motivo dos “ocupa”.

Sob a assunção da função inalienável do analista cidadão, as “mães do Ocupa” revelam dois aspectos da hiper/líquida/pós-modernidade: entender que, em uma época em que o Outro não existe, o outro lhes permite remeter ao essencial de si e, em um momento do declínio do simbólico, logo dos modelos, tentam inventar um novo amor de que fala Forbes.

Na pós-modernidade, em que o laço social das identificações é predominantemente horizontal, se se revelam movidas pelo gozo imediato, revelam-se também movidas pelo afeto fundamental: a amizade. As presenças físicas dos próximos permitem-nos remeter ao nosso inalienável ponto mais íntimo que nos escapa, porque nos é estranho e externo, e nos habita, o que levou Lacan a nomear de “êxtimo”.

Engravidarem de desconhecidos é certamente um atentado ao ato politicamente correto. Entretanto, como afirma Forbes, a fórmula do politicamente correto funciona em termos de necessidade, mas nem sempre em termos do desejo, e desejar, como afirmou Lacan, é sempre desejar outra coisa. Uma era sem padrões do como se comportar favorece as expressões singulares de cada pessoa e por conseguinte o aumento da estranheza das escolhas.

Tendo estendido a “insatisfação e a disposição para fazer diferente”, fundamento do Ocupa, para a maternidade, “na forma de criar os filhos ou na maneira de amar" como afirmam, revelam tentar inventar um novo amor.  Eis o que nos ensinam as “mães do ocupa”: assumir um amor sem intermediações, sem garantias.

Eis a contribuição do analista lacaniano: devemos compreender que não há respostas prontas. Devemos tomar decisões arriscadas e criativas, e por elas nos responsabilizarmos.

Data de publicação: 01/11/2012

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